MITOS E VERDADES SOBRE OS INSETOS E OUTROS ARTRÓPODES QUE VIVEM NA SUA CASA

Insetos, aranhas, escorpiões e demais tipos de artrópodes frequentemente estão associados à imagem de animais “venenosos”, que têm aparência desagradável e que causam reações de nojo. Mas será que as crenças e mitos relacionados a esses animais podem ter alguma verdade?

VAMOS DESCOBRIR...


Nas localidades mais influenciadas pela mídia, que normalmente mostra que esses animais devem ser exterminados, eles são mais notados, porém sempre com uma conotação negativa. Tal fato é aproveitado pelas indústrias produtoras de praguicidas, que lançam suas campanhas para combater, indiscriminadamente e cada vez em maior número, esses organismos. A indústria cinematográfica corrobora essa atitude, pois os filmes raramente projetam imagens positivas dos artrópodes. Ao contrário, eles exploram imagens sinistras de perigo ou morte, imagens chocantes que provocam medo e pavor e também imagens caricaturais (antropomorfizadas) para ridicularizarão.

Insetos e outros artrópodes na Antiguidade


A visão geral dos artrópodes na Antiguidade não era melhor do que a que se tem hoje em dia. No Brasil, em 1584, o padre Fernão Cardin já dizia: “Parece que este clima influi peçonha, assim pelas infinitas cobras que há, como pelos muitos alacrás, aranhas, e outros animais imundos, e as lagartixas são tantas que cobrem as paredes das casas, e agulheiros delas”. Durante os séculos XVI e XVII, os insetos foram a fonte para a construção de monstros zoomorfos: bruxas metamorfoseadas em mariposas ou morcegos; demônios com corpo de mulher, cabeça de sapo e assas de libélulas etc.

Insetos e outros artrópodes na medicina


Fantasias e lendas à parte, as atitudes dos indivíduos diante dos artrópodes não é de todo injustificada: alguns desses animais podem de fato causar transtornos à saúde humana, um vez que substâncias tóxicas podem ser injetadas tanta por ferrões retráteis, quanto por peças bucais penetrantes ou através de setas urticantes. No jargão médico, os efeitos negativos da ação dos insetos e demais artrópodes na saúde e bem-estar humanos são conhecidos como artropodoses. A ação indireta ocorre quando esses animais atuam como vetores de agentes infecciosos. O contato acidental com espécies peçonhentas ou venenosas muitas vezes deixa as vítimas debilitadas, com sequelas, podendo mesmo ocasionar óbito. A gravidade dos sintomas depende da espécie envolvida, da quantidade de peçonha injetada, da reação alérgica e do fornecimento de sangue ao local atingido.

Os nomes comuns dos insetos e outros artrópodes e nomes científicos


Muito do temor e respeito que os seres humanos sentem pelos artrópodes vê-se refletido nos nomes populares que se atribuem a eles. Os nomes dos organismos trazem os princípios de classificação e, portanto, revelam bastante sobre a maneira como os indivíduos conceituam os seres vivos de seu entorno. Com efeito, todos os elementos de um organismo – conceitos e percepções a seu respeito, suas partes anatômicas, seus usos e as relações com outros organismos – podem, em um dado momento, ser unificados por um identificador único: seu nome. Dessa maneira, os nomes comuns, vernáculos ou nativos devem ser trados com atenção meticulosa, ou sua informação e utilidade se perdem.

O nome de uma animal ou de uma planta aponta para um conceito, categoria ou táxon, que é um arquivo de história natural cheio de informação, uma vez que pode revelar, assim como, às vezes, obscurecer como os processos de percepção, identificação e nominação foram e estão organizados. A obtenção do vocabulário (léxico) adotado por determinada população local seria primeiro passo para acessar as informações sobre os diversos domínios cognitivos que compõem a mente, e também uma forma de aproximação indireta da formação e difusão de conceitos relacionados ao universo pesquisado.

A compreensão da formação linguística do nome de um organismo, aliada aos estudos sobre conhecimento zoológico tradicional, podem contribuir na pesquisa ecológica a partir da taxonomia e sistemática popular, que considera o meio no qual as diferentes culturas agrupam e caracterizam os organismos no seu entorno, além de ser um indicativo da diversidade local. Por outro lado, os modos como os animais são percebidos e classificados definem as possíveis interações entre os seres humanos e as espécies que compartilham seu meio físico ou simbólico. Pesquisas revelam que os processos de categorização são influenciados culturalmente (categorias cognitivas) e organizados em padrões lógicos (estruturas taxonômicas) distintos de cada sociedade.

Agora mostraremos alguns exemplos de nomes populares de uma pesquisa feita no estado da Bahia (também entre outras), relacionados com sua classificação cientifica e a crença local:

AS BARATAS


Barata comum


Família:
Blattidae.

Crença local: No povoado de Pedra Branca, a expressão “A casa está de correição” significa que tem muita barata dentro de casa; ela foi considerada transmissora de um tipo de “verme” que afeta o fígado. Porém isso não é comprovado.


Carocha, barata preta


Crença local: A carocha é tida como “venenosa” porque “ela esguicha as galinhas quando estas vão comê-la”.

Verdades: as baratas não possuem veneno, não são perigosas para o ser humano. Mas podem carregar microrganismos que podem causar doenças devido ao local onde vivem.

BICHO-PAU


Imagem de Andreas por Pixabay 

Família: Phibalosomatidae.

Outros nomes comuns: louva-a-deus-de-cobra, louva-a-deus-virado-de-cobra, bicho-que-vira-cobra, bicho-do-camará, garrancho.

Crença popular: Em Pedra Branca, diz-se que este inseto se transforma em cobra-cipó (Phylodrias sp.), por isso o povo acredita que sua “mordida” traz resultados ruins. Considerado um “bicho nojento”.

Verdades: inseto não peçonhento (não possui veneno). Inofensivo para a saúde humana.

GRILOS


Foto: CLeverson Felix

Família: Gryllidae.

Outros nomes populares: Grilo-doméstico, grilo-caseiro, grilo-popular, grilo-tradicional, grilo-preto.

Mitos: No município de Feira de Santana, os transtornos alegados aos grilos são: alegria, lesões na pele, inflamações com transmissão de organismos patogênicos e dores. Também é dito que o grilo pode prejudicar a saúde de animais domésticos: se um cachorro comer grilo passa mal, podendo morrer se ingerir uma certa quantidade.

Verdades: os grilos não são venenosos, são insetos que não causam danos a saúde humana. Até em alguns países são comidos e considerados como iguarias, que é o caso dos chapulines no México. Mas os grilos pode causar danos a lavouras de agricultura em fazendas dependendo de seu numero de indivíduos.

ESPERANÇA


Foto: Cleverson Felix

Família: Tettigoniidae.

Ouros nomes: Esperança-do-olho-brilhoso

Crença: Acredita-se que ela traz aviso de que algo ruim vai acontecer. Mas em alguns lugares, se visto é tido como animal que pode trazer sorte.

Verdades: Animal inofensivo ao ser humano. Não é venenoso. E não há bases científicas que comprovem que tal espécie traga algum mal ou bom presságio.

MARIPOSAS E LAGARTAS


Mariposa-chupa-umbigo


Foto: Cleverson Felix

Ordem:
 Lepidoptera.

Outros nomes: bruxa, mariposa bruxa

Mitos populares: Em Pedra Branca, esta mariposa “chupa o umbigo das crianças recém-nascidas”. A bruxa também é associada se passar perto pode causar cegueira.

Verdades: alguns lepidópteros são bastante venenosos em seus estágios larvais, inclusive bastante venenosos levando a quadros de óbitos. Mas na fase adulta, como nesta mariposa, muitas soltam um "pó" por suas asas. Dependendo da espécie, e do quadro alérgico da vítima e do local onde cair essa substância, pode sim levar a um quadro grave. 

Lagarta-de-fogo


Foto: Cleverson Felix

Ordem: Lepidoptera.

Outros nomes: Lagarta-do-cajueiro

Dito popular: “A lagarta-do-cajueiro é braba porque até os cabelos que ficam na casa (casulo) irritam, incham a pessoa toda”.


Verdade: como dito acima, algumas lagartas são bastante venenosas, essa lagarta-de-fogo, dependendo do quadro clínico pode sim levar a morte. Muitas outras como a da espécie Lonomia, são extremamente perigosas, é aconselhável manter distância e não tocar nelas.

Lagarta-sete-couro


Foto: Cleverson Felix.

Família: Pergidae.

Outros nomes comuns: lagarta-sete-capote, lagarta-capa, mata-porcos

Crença popular: Acredita-se que este inseto cause frieira. Para curar-se, o couro dos pés deve cair sete vezes.

Verdades: como dito anteriormente a, as lagartas dos lepidópteros podem ser bastante perigosas. O nome popular de mata-porcos, é devido porque é tóxica para o gado. Porcos ou bovinos que ingerirem larvas apresentam mudanças de comportamento, e morrem menos de 2 dias depois dos primeiros sintomas.

CIGARRAS


Foto: Cleverson Felix

Ordem: Hemiptera.

Mito popular: Nos povoados de Pedra Branca e Tapera, acredita-se que se “urina” da cigarra cair nos olhos pode provocar cegueira. Outros lugares dizem que seus cantos "chamam chuva".

Verdades: Inseto inofensivo ao ser humano. O fato citado de "urinar" em cima das pessoas não é verdade, pois ela não urina e sim quando esta se alimentando da seiva das árvores, cospe o excesso para fora. Em relação a chuva, ainda não há estudo científicos que comprovem tal fato quando elas cantam, que está mais relacionado ao seu período de acasalamento, pode ser que ele coincida com o início do período de chuvas em algumas partes do país.

Leia mais:

JETIRANABÓIA


Imagem de Josch13 por Pixabay 

Família: Fulgoridae.

Outros nomes populares: jitirana, tiranabóia, cobra-de-asa, cobra-cega, serra-velha, cobra-que-voa.

Mitos populares: É crença geral que este inseto é muito venenosos: “A gente tem medo porque pica a gente. É igual à cobra. O veneno que a cobra tem, ela tem”. O “ferrão” (aparelho bucal) é por onde o inseto supostamente injeta o “veneno”.

Verdades: inseto totalmente inofensivo ao ser humano.


VAGA-LUME


Imagem de Francisco Corado Rivera por Pixabay 

Ordem:
Coleoptera.

Crença popular: moradores de Pedra Branca disse: “Ele não morde, mas se a gente pegar nele, ele junta as unhas assim e fura. Fura a pele da gente”.

Verdades: insetos inofensivos e não causam danos a saúde do ser humano. A espécie de vaga-lume mais comum no Brasil é a Lampyris noctiluca, na qual apenas os machos são alados. Produzem a luminosidade em seu abdomem através de um fenômeno chamado de bioluminescência. 

MARIMBONDOS E VESPAS


Marimbondo-caçador


Foto: Cleverson Felix


Ordem: Hymenoptera.
Família: Pompilidae.

Outros nomes populares: maribondo-caçador, marimbondo-cavalo, mata-cavalo, vespa-caçadora, vespa-de-cobra, vespão, caçador-de-aranha, caba-caçadeira, come-cobra, come-aranha, cavalo-do-cão e caçununguçu.

Crença popular: Segundo um morados de Pedra Branca: “É muito ofensivo. Vixe Maria! Quando pica é dor de cabeça, febre e outros bichos mais. Quando ferra a pessoa, ele enfia a agulha e solta um líquido”.

Verdades: a maioria das vespas possui veneno em seus ferrões. Mas muito depende do quadro clínico da pessoa que foi atacada, se ela possuir alergia a insetos, o quadro pode se agravar. O entomólogo Christopher K. Starr, do departamento de entomologia da Universidade da Georgia, criou um índice de dor, que vai de 1, bem leve ou indolor, a 4, os mais doloridos de todos; a picada da vespa caçadora de tarântulas foi classificada como nível 4 de dor. A escala de dor pode ser vista no site logo abaixo em referências.

Marimbondo-garrote


Outros nomes populares: marimbondo-saco-de-boi, marimbondo-capanga-de-garrote

Crença: Um morador do povoado de Pedra Branca disse: “Esse também é tão perigosos que quando morde a gente chega a tapar a goela”.

Verdade: essa espécie de marimbondo tem que se ter cuidado, como todas as outras espécies de vespas. A maioria possui veneno em seus ferrões. Se um enxame atacar pode levar a morte.

Marimbondo-carniça


Outros nomes comuns: marimbondo-açougueiro

Crença popular: Os nomes populares referem-se ao fato de coletar alimentos em carcaças de animais.

Verdades: todas as vespas e marimbondos são perigosos, ainda mais se as pessoas tiverem alergias. Em relação a esse marimbondo coletar alimentos em carcaças de animais, não há dados científicos que comprovem tal ato, sendo assim somente um mito popular. Veja um artigo científico detalhado sobre esta espécie, Biologia comportamental de Agelaia vicina: forrageio e comportamento das operárias e desenvolvimento dos ninhos (Hymenoptera: Vespidae; Epiponini).

PIXIXICA


Família: Formicidae.

Outros nomes: caçarema, formiga-caçaramba

Dito popular: Um morador de Pedra Branca disse: “Ela morde. Persegue mesmo, arde mesmo, que parece que é cansação ou urtiga.

Verdades: Possui grande importância ecológica e econômica, principalmente no setor cacaueiro das regiões sul e sudeste da Bahia, devido a suas picadas dolorosas que torna a colheita do cacau dificultoso. Também é conhecida como pequena formiga de fogo ( little fire ants) e confundidas com a também formiga de fogo Solenopsis invicta.

PIOLHO-DE-COBRA


Totodu74, CC BY-SA 3.0, via Wikimedia Commons

Ordem: Diplopoda.

Outros nomes: gongo, gongolo, ingongo, embuá, bicho-do-ouvido 

Crença popular: Acredita-se que “o veneno é pior que o da cobra”. Se o animal morder, deve-se contar suas pernas.

Verdades: É mito a relação ao piolho-de-cobra com uma serpente. Esse nome é dito assim apenas por costumes regionais pelo fato de ser bastante articulado e se encolher quando se sente ameaçado. São esses os únicos pontos em comum. Esses animais não são venenosos e nem danosos a saúde humana.

CRUSTÁCEOS


Almofada


Ordem: Crustacea.
Família: Grapsidae.

Crença popular: Acredita-se que seu consumo cause câncer, tuberculose e “fome canina”.

Verdades: não há dados científicos que comprovem que seu consumo cause câncer nem outro tipo de doença.

Guaiamu


Imagem de Katrin Schulz por Pixabay 

Ordem: Crustacea.
Família: Gecarcinidae.

Outros nomes: gaiamum, caranguejo-azul

Mitos populares: Segundo pescadores do Conde, “as mulheres recém-paridas não pode comer gaiamum porque ele é um caranguejo muito carregado devido às ervas brabas que ele come”.

Verdades: Não há dados científicos que comprovem que se mulheres que acabaram de dar a luz comerem esse crustáceo podem ter algum problema. No Brasil, o crustáceo está ameaçado de extinção em várias partes de seu território, sobretudo devido à caça predatória e à destruição do seu habitat. Em virtude disso, várias medidas governamentais vêm sendo tomadas, incluindo a criação de áreas protegidas e a adoção da prática do período de defeso.

Referência
CARDOSO, et al. Animais Peçonhentos no Brasil. Biologia, clínica e terapêutica dos acidentes. Editora Sarvier. 2009.

3 comentários:

  1. Piolho de cobra (gongolo) não é inseto! É myriapoda. Isso é um erro sério porém muito comum entre o público leigo. O que acaba tirando a credibilidade do texto postado aqui. Foi realmente escrito por biólogo?

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    1. Boa noite Elaine,

      O título da postagem é: Mitos e verdades: insetos e OUTROS ARTRÓPODES. E sim foi escrito por biólogos. E sim o piolho-de-cobra é um membro do subfilo Myriapoda.

      Agradecemos pelo comentário, um grande abraço.

      Equipe BioOrbis.

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    2. Já a imagem identificada como Phibalosoma sp. está bem errada. Este é um gafanhoto da família Proscopiidae.

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